Em Portugal, o rendimento médio anual bruto por anfitrião na rede de alojamento local Airbnb é maior do que em Itália ou Espanha; apenas o Japão supera a média nacional, indica um estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI), que vê margem para aumentar a coleta de impostos sobre este tipo de negócios, para melhorar aquilo a que chama de “governo digital”.
O capítulo analítico do Monitor Orçamental (Fiscal Monitor), ontem apresentado pelo diretor do departamento de Finanças Públicas do FMI, o antigo ministro das Finanças português, Vítor Gaspar, indica possíveis caminhos para que os Estados maximizem a receita fiscal proveniente das novas formas de negócio digitais, em rede, como o alojamento local Airbnb, um modelo esmagadoramente popular em Portugal.
Na apresentação do estudo “Governo digital”, Gaspar e Geneviève Verdier, uma das suas adjuntas no departamento, constataram que “as pessoas estão a substituir os táxis pelo Uber, os hotéis pelo Airbnb e o dinheiro vivo pelo PayPal”. “E os governos, podem ficar à margem desta transformação? Provavelmente, não”, adiantaram.
No caso do Airbnb, embora o FMI considere que o rendimento médio ganho por cada anfitrião ainda seja “baixo”, há margem para o Estado fazer melhor, preparando-se digitalmente para lidar com este tipo de negócios.
Subscrever newsletter
Subscreva a nossa newsletter e tenha as notícias no seu e-mail todos os dias
Num conjunto de 15 países analisados, cada anfitrião de Airbnb sedeado em Portugal ganhará perto de 6,8 mil dólares anuais brutos (5,5 mil euros) a explorar esta forma de partilha de casas, ligeiramente mais até do que o rendimento médio por proprietário gerado em Itália e Espanha (4,9 mil e 4,6 mil euros, respetivamente). O Japão lidera: cada dono de Airbnb estará a ganhar cerca de 10,1 mil dólares brutos ao ano (8,2 mil euros).
Estes números detalhados foram disponibilizados por fonte oficial do FMI a pedido do Dinheiro Vivo.
Além de ter o segundo maior rendimento médio anual por anfitrião, Portugal é o décimo país mais procurado na rede Airbnb, indica esta empresa. O ranking é liderado por Estados Unidos, França e Itália.
A questão, diz o FMI, é que muitos governos só parecem estar a operar ao nível da base tributável dos impostos indiretos.
Quando mais baixa for a fasquia de rendimento a partir da qual se começa a pagar imposto, mais proprietários terão de declarar rendimentos do negócio ao Fisco. É o caso de Portugal, cuja fasquia está apenas ligeiramente acima do nível médio de ganho com a exploração dos Airbnb.
Fiscos têm de acompanhar a evolução dos tempos
Ora, para o Fundo, aquela questão levanta problemas e adia a desejada modernização ou atualização das máquinas fiscais para liderem com estes novos negócios.
Nestes mercados digitais, em que a presença de empresas pequenas e unipessoais é muito elevada (e está a crescer), “os governos podem considerar reduzir a tal fasquia de modo a trazer mais pequenos negócios para dentro do sistema fiscal”.
No entanto, este aperto fiscal “tem de ser analisado, tendo em conta os riscos de evasão, de não cumprimento e de custos administrativos maiores”.
Assim é porque quanto mais próximo estiver um contribuinte da possibilidade de ter de pagar imposto (caso do modelo Airbnb), maior o risco de aumentar os custos da aplicação dos impostos (quer para o sector público, quer para os privados), mas também maior “o risco de haver incumprimento (legal e ilegal)” da parte de quem explora casas em modo Airbnb ou em qualquer outra rede de partilha equivalente (P2P ou peer to peer, entre pessoas), observa o estudo do FMI.
Tributar a acumulação de dados pessoais?
Ontem em Washington, Vítor Gaspar e a sua equipa observaram que “alguns desafios estão relacionados com as políticas. Empresas como Google, Apple, Facebook e Amazon são bem conhecidas, mas as empresas digitais estão por toda parte e geram vendas com pouca presença física”.
Se é assim, se as empresas digitais “beneficiam do valor gerado pelos seus utilizadores — o uso de aplicações nos nossos smartphones produz informações gratuitas, porém valiosas”, “será que os governos podem e devem tributar esse valor gerado onde o consumidor reside, mesmo quando a empresa tem sede física noutro lugar?”, questionaram Gaspar e Verdier. Se tal fosse possível, haveria aqui uma nova fonte de receita, é essa a ideia.
Os dois dirigentes do FMI observaram ainda que “alguns países, como Israel e Itália, adotaram medidas tributárias especializadas visando as empresas digitais, mas essas soluções não coordenadas não são a resposta”. “À medida que toda a economia se tornar digital, serão necessárias soluções de âmbito mundial”, defenderam.