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A Eco-Oil, empresa de Setúbal especializada no tratamento de águas contaminadas com hidrocarbonetos, é a primeira no mundo a produzir fuel sustentável. Assim o atesta a certificação pelo ISCC (International Sustainability and Carbon Certification), que conclui que o EcoGreen Power "reduz de forma comprovada 99,75% das emissões de CO2 na indústria". A meta agora é conseguir que este combustível 100% reciclado e que substitui integralmente as energias fósseis tenha um enquadramento fiscal compatível.
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A certificação levou mais de um ano e só chegou em agosto de 2022. "Os critérios de sustentabilidade para serem aplicados no nosso negócio eram relativamente simples, mas o facto de sermos os primeiros tornava o processo bastante complicado. Nós já tínhamos um resíduo base, que servia de matéria-prima para a produção de um combustível, e por aí teríamos todas as condições de sermos certificados, mas a necessidade de esclarecer qual era o nosso objetivo, de perceber como é que se podia enquadrar e o facto de sermos os primeiros tornou o processo um pouco mais lento, mas chegámos lá e assim surgiu o primeiro combustível a fuelóleo certificado do mundo, com as suas emissões certificadas também", diz o CEO da empresa.
A Eco-Oil nasceu em 2001 para tratar as águas contaminadas dos navios-tanque que chegam aos estaleiros da Lisnave para reparação. E foi a partir da recuperação e tratamento desses resíduos de hidrocarbonetos que nasceu fuelóleo sustentável que vende a empresas industriais desde 2015, inicialmente sob a designação de nr 4 BTE - Baixo Teor de Enxofre, e desde o início de 2021 com a marca EcoGreen Power.
Em 2020 a empresa vendeu 24 mil toneladas de EcoGreen Power e no ano seguinte chegou às 31 mil toneladas, esgotando praticamente a capacidade da unidade de Setúbal. Em 2022, a guerra na Ucrânia gerou "grandes dificuldades" de abastecimento de matéria-prima, obrigando mesmo ao encerramento da fábrica durante um mês. Uma situação entretanto acautelada com a "abertura de novas fontes/origens de importação" destes resíduos, e para 2023 a meta definida é de 20 mil toneladas. Mas a faturação, que em 2022 cresceu quase 20%, para nove milhões de euros, deverá neste ano aumentar quase 50%, para os 14 milhões de euros.
"Não vamos vender mais, mas vamos vender melhor cada uma das unidades que aqui produzimos", sustenta Nuno Matos.
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E se é verdade que nunca lhe faltaram clientes, a expectativa é de que a certificação constitua uma importante alavanca, designadamente através da diversificação de áreas de negócio. "Uma coisa é ser eu a dizer que temos um combustível derivado de resíduos, que tem um impacto ambiental positivo, etc., outra é ser um instituto internacional a certificar que o EcoGreen Power tem uma redução de emissões de 99,75% face ao combustível fóssil alternativo, o que tem um impacto grande na decisão do cliente", refere o responsável.
A certificação permite que clientes "que tenham uma visão ampliada do ponto de vista da sustentabilidade e da descarbonização, como é o caso das indústrias de laticínios ou do papel, possam assumir o nosso combustível como uma das ferramentas para reduzirem as suas próprias emissões". Por outro lado, abre portas a novos setores de atividade, como a indústria têxtil.
Já a aposta no segmento naval foi para já posta de parte. A empresa conseguiu desenvolver um combustível melhorado para ser utilizado em navios e, apesar de ter sido bem-sucedida nos ensaios laboratoriais, percebeu que os investimentos necessários para escalar o projeto ao nível industrial eram de tal modo elevados que "não permitem a sua concretização imediata".
Em contrapartida, a certificação ISCC Plus surgiu do "interesse de muitas petrolíferas e de muitos players internacionais em incorporar este nosso combustível nos seus combustíveis marítimos", algo a que a Eco-Oil não pode, para já, dar resposta por falta de capacidade logística. "Para isso teríamos de ter mais tanques e os processos de licenciamento em Portugal são muito lentos. Estamos há dois anos a licenciar um tanque", diz Nuno Matos.
A aponta ainda o dedo ao que chama "disfunções" entre os discursos públicos em favor da descarbonização e o apoio, ou a falta dele, que é dado às energias sustentáveis. Segundo ele, o EcoGreen Power continua a ter o mesmo enquadramento fiscal que o fuel fóssil, não havendo qualquer vantagem fiscal ou incentivo ao seu consumo.
Mais uma vez o cariz inovador do projeto não ajuda. "Estamos em contacto quer com a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) quer com a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), contudo, o facto de sermos pioneiros e termos este combustível, sendo desde logo o primeiro do mundo, cria grandes dificuldades." E acrescenta: "A nossa legislação em Portugal é um bocadinho requentada. Vem da Comissão Europeia, já vem feita, nós reaquecemos e transpomos para o enquadramento legal português. Havendo em Portugal algo que é totalmente inovador, as entidades têm muita dificuldade em perceber como é que isto se encaixa e como podem dar enquadramento."
A discussão pública de um decreto-lei para o mercado voluntário do carbono em Portugal pode ser a solução. "Parece-nos um instrumento importante se se conseguir introduzir estas vantagens visíveis e tangíveis para os clientes por consumirem uma energia sustentável em detrimento da fóssil. Vamos participar", sublinha.