Que papel têm as empresas na felicidade e bem-estar dos seus colaboradores? Ainda que a relevância desta questão seja incontornável e que não haja prazo de validade para a sua discussão, falar sobre ela no início de 2023 não podia ser mais relevante. É que este ficará na História como o ano da implementação da primeira norma de Gestão de Bem-estar e Felicidade Organizacional, um documento inédito em Portugal que mostra o muito que já se evoluiu e, ao mesmo tempo, o caminho que ainda está por percorrer nesta área.
Este ano ficará na História como o ano da implementação da primeira norma de Gestão de Bem-estar e Felicidade Organizacional
E foi justamente para discutir que peso ocupa o critério Social dos critérios ESG (em português, Ambiente, Social e Governança) nas agendas das organizações que Mariana Canto e Castro, diretora de Recursos Humanos na Randstad Portugal, Isabel Moço, especialista em gestão de recursos humanos e professora na Universidade Europeia, e Regina Cruz, fundadora da WellBeing 3.8 e membro do grupo de trabalho da nova norma, se sentaram "À Mesa do Trabalho", uma iniciativa da Randstad Portugal e da TSF.
Uma das primeiras oradoras a tomar a palavra foi Isabel Moço, que explicou que, para perceber de que forma é que a responsabilidade social se alinha ao mundo empresarial, é preciso recuar um pouco. Embora o conceito giving back to society (em inglês, "retribuir à sociedade") seja uma preocupação relativamente recente nas agendas dos gestores, "é um movimento que está dentro da responsabilidade social corporativa [e sobre o qual] já falamos há 50 anos", afirma.
No fundo, trata-se de "usar os recursos, o poder e a influência de uma organização para criar um impacto positivo no mundo", explica a docente. Mas antes de implementar ações para melhorar os problemas lá fora, os líderes têm de "olhar para dentro" da própria empresa, nomeadamente, para os seus colaboradores, defende a mesma especialista.

Subscrever newsletter
Subscreva a nossa newsletter e tenha as notícias no seu e-mail todos os dias
Diversidade e inclusão no recrutamento
A escassez de talento, ou seja, a dificuldade ou incapacidade de contratar trabalhadores para certos setores, é um dos maiores desafios que as empresas enfrentam atualmente. Mas será esse obstáculo provocado pela falta de mão de obra qualificada no mercado de trabalho? Mariana Canto e Castro apresenta outra hipótese.
"Se calhar diz-se que há escassez de talento porque procuramos sempre os mesmos talentos, nos mesmos sítios, com os mesmos perfis, e sabemos que há segmentos que são sistematicamente deixados de fora de processos de recrutamento", refere a diretora de recursos humanos da Randstad Portugal.
As pessoas mais velhas e os candidatos portadores de deficiência são alguns dos grupos que mais sofrem desta discriminação, apesar de serem "tão aptos como quaisquer outros ou mais", diz Mariana Canto e Castro. Caminhar em direção à responsabilidade social significa, em primeiro lugar, ter equipas inclusivas que reflitam as prioridades, necessidades e desafios da sociedade atual. Contudo, este é apenas o primeiro passo.
"Estamos a fazer com as pessoas o mesmo que fazemos com a natureza: temos uma relação de exploração", condena Regina Cruz
Qual é o maior valor de uma empresa?
A responsabilidade da empresa para com as suas pessoas não acaba no momento da contratação. Vai muito além disso. "Quando as pessoas começam a trabalhar na empresa, geralmente vêm cheias de energia e entusiasmo. E por que não devolvermos essas pessoas à sociedade com o mesmo grau de energia e de entusiasmo, em vez de as devolvermos esgotadas, cansadas, incrédulas e até desiludidas com aquilo pelo qual passaram?", questiona Mariana Canto e Castro.
"Olhamos para as pessoas e para as empresas como se fossem máquinas", condena Regina Cruz. "Estamos a fazer com as pessoas o mesmo que fazemos com a natureza: temos uma relação de exploração". "O sucesso de uma empresa do século XXI não pode ser medido só pelo valor financeiro. Tem de ser medido por uma série de valores, incluindo o social. Aqui, as pessoas ganham uma importância enorme", defende a fundadora da WellBeing 3.8.

Felizmente, as empresas "estão a começar a entender" essa importância e os bons exemplos já não se contam pelos dedos de uma mão, garante a mesma especialista. E a Randstad Portugal é prova disso. "Quinzenalmente, temos um inquérito em que escutamos os nossos colegas e temos taxas de participação incríveis, na ordem dos 96%", admite a diretora de recursos humanos da empresa.
E há uma razão que leva a larga maioria dos colaboradores a tirar um momento para responder às perguntas, mesmo nos dias mais atarefados. "Porque sabem que olhamos para as respostas e tentamos tomar medidas que vão de encontro àquilo que nos manifestam", explica Mariana Canto e Castro, "e sabemos também, através desse inquérito, que muitas vezes é isso que faz com que as pessoas tomem a decisão de ficar".
Ouvir e apoiar os colaboradores são deveres que, ao final do dia, dão retornos às empresas. Desde que se sintam respeitados e valorizados numa cultura que se guie pelos valores certos, também os trabalhadores vão contribuir para, em conjunto com a organização, deixar um legado positivo no mundo.