Comprar carro, novo ou usado, é para a generalidade dos consumidores uma decisão importante e que merece ponderação, mas a análise dos profissionais do setor parece trazer boas notícias para os compradores. Se, por um lado, o preço dos automóveis em segunda mão deverá estabilizar com mais oferta e algum abrandamento na procura, também nos veículos a estrear poderá assistir-se a uma diminuição dos prazos de entrega, ainda que superiores aos normais. "O problema não está só na produção, mas também no transporte", aponta Manuel Coutinho, diretor executivo do Grupo Motopor e um dos convidados do último Barómetro Automóvel, programa da TSF/Dinheiro Vivo com apoio do Standvirtual.
"O mercado nacional virou-se para a importação com carros de melhor qualidade, de menor quilometragem e mais elétricos"
Para o especialista, o tema do transporte é "tremendamente difícil" e a "incerteza" no mercado automóvel está para continuar em 2023, embora considere expectável que se assista a melhorias em alguns aspetos. Os constrangimentos provocados pela pandemia no transporte de mercadorias continuam a ter efeito negativo em várias áreas e a indústria automóvel não é imune. Paulo Moreira, diretor de operações da CarPlus, concorda com a ideia e diz mesmo que a dificuldade se estende ao mercado de usados, nomeadamente na importação a partir de outros países. "É a falta de transportes e o custo. O custo para trazer um carro da Alemanha ou da Polónia hoje é de quase 700, 800 euros e aqui há uns anos era de 300 euros", exemplifica.
Apesar de o mercado de veículos seminovos e usados em Portugal ter recorrido à importação nos últimos anos, de forma a fazer face à escassez de oferta interna, os responsáveis da CarPlus e da Motopor dizem ter usado pouco esta possibilidade. No cômputo geral, Nuno Castel-Branco, diretor-geral do Standvirtual, aponta que existem hoje cerca de 40% de carros importados no mercado nacional de usados. "O mercado nacional virou-se para a importação com carros de melhor qualidade, de menor quilometragem e mais elétricos", salienta.

Os índices de confiança dos consumidores têm vindo a descer desde o verão, o que, em conjunto com a subida da inflação e das taxas de juro, tem provocado um "abrandamento da procura", diz ainda Nuno Castel-Branco. Tudo isto fará com que, na sua perspetiva, haja "uma maior estabilização no preço dos usados" -, que cresceu cerca de 25% nos últimos anos - e que, em 2023, haverá boas notícias para quem compra em termos de mais oferta e de melhores preços. Já no que respeita ao mercado dos novos, cujo crescimento foi de cerca de 2,5% em 2022, os tempos de entrega nos próximos 12 meses deverão reduzir, mas dificilmente abaixo dos três meses.
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Mobilidade individual continua a ser importante
Manuel Coutinho acredita que mais do que a pandemia, são os fatores de contexto que têm provocado as maiores alterações no setor automóvel e que têm prejudicado a mobilidade individual dos portugueses. Questões como o aumento de impostos relacionados com o Imposto Único de Circulação (IUC), as portagens ou o combustível, a que acresce o aumento dos custos na compra de um automóvel, torna "os carros mais inacessíveis" a uma parte da população. "A mobilidade individual é necessária. Está previsto [o Governo] anunciar o [incentivo ao] abate no primeiro semestre do ano, o que é uma excelente notícia, porque mais de 20% dos carros têm mais de 20 anos e são altamente poluentes", explica o diretor executivo da Motopor.
Embora existam ainda poucos veículos elétricos usados no mercado, este é o segmento "que tem uma procura mais desproporcionada face à oferta"
Coutinho não tem dúvidas de que os fatores ambientais são importantes, mas defende ser preciso "equilibrar" a preocupação com as emissões com a acessibilidade da população ao automóvel, em particular para aqueles que vivem em zonas mais rurais e com menos oferta de transporte público.
Sobre o aumento do número de veículos elétricos no mercado de usados, Paulo Moreira considera que, em muitos casos, os motores a combustão "continuam a ser uma solução bastante interessante" para quem procura automóveis usados. Ainda assim, defende, é necessário "mudar o mindset" e melhorar as condições de aquisição, mas também de carregamento dos elétricos, para motivar uma transição mais generalizada.

Já Nuno Castel-Branco recorre aos dados recolhidos pelo Standvirtual para mostrar que, embora existam ainda poucos veículos elétricos usados no mercado, este é o segmento "que tem uma procura mais desproporcionada face à oferta". "A verdade é que o consumidor final está a mostrar muita apetência pelos carros elétricos", defende. Tendo em conta que os automóveis elétricos novos ainda são relativamente poucos nas estradas, em comparação com os de combustão, e que será preciso aguardar alguns anos até que comecem a chegar ao mercado de usados em maior quantidade, a adoção da eletrificação pelos consumidores de usados ainda tem um longo caminho pela frente.