Vive em S. Francisco e já trabalhou na Ubisoft e Rockstar Games. O game designer por trás de 12 Minutes, um jogo inspirado em Kubrick e Hitchcock, apresentou a sua ambição em Los Angeles.
Na conferência mais antecipada da E3 2019, em Los Angeles, a Xbox selecionou o trailer de um jogo independente que poderia ser confundido com um thriller passional. 12 Minutes conta a história de um homem preso numa cadeia de acontecimentos que recomeçam continuamente e tem todos os elementos de um mistério: um teste de gravidez, um passado desconhecido, um polícia que entra de rompante e um desfecho que é sempre fatal. A reação da audiência que estava no Microsoft Theater e assistiu à estreia mundial do trailer foi mais do que entusiasmada. Online, muitos comentaram que este era um dos jogos desconhecidos mais interessantes apresentados na conferência. Por detrás dele, o nome do português Luís António, um criador de videojogos que está determinado em tornar este título um sucesso mundial.
“O grande objetivo é fazer algo que seja uma experiência, algo como um bom livro ou um bom filme”, diz o autor ao Dinheiro Vivo. “É algo que abre a curiosidade, que requer um esforço do lado do observador para tentar juntar as peças e ver se vale a pena saber mais.”
Luís António, 37 anos acabados de fazer, é pouco conhecido no panorama nacional mas tem no currículo algumas das maiores referências da indústria. Trabalhou na Rockstar Games, responsável por inúmeros cenários e personagens do jogo Manhunt 2, e foi depois para a Ubisoft, onde passou de artista principal a diretor de arte. Mais tarde, passou vários anos a trabalhar com Jonathan Blow no jogo The Witness, da Thekla, o que lhe rendeu bastante reconhecimento.
“A razão pela qual saí de Portugal há 15 anos e andei por muitas companhias é que não havia indústria”, explica. A ideia por detrás de 12 Minutes surgiu há seis anos e foi um projeto solitário, que desenvolveu no tempo livre enquanto trabalhava em The Witness.
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A viver em São Francisco, começou a dedicar-se em exclusivo ao seu próprio jogo há dois anos, em parceria com a Annapurna Interactive. E agora, com financiamento, uma equipa de animadores, sound design, músicos e o apoio da Microsoft, prepara-se para lançar 12 Minutes no início de 2020. O jogo será um exclusivo da Xbox nas consolas e terá versão PC/Mac, ainda sem preço final determinado.
“Trabalhei sozinho e quando vi que o conceito tinha potencial comecei à procura de investimento e parcerias, para poder realizar isto com qualidade sem ter de hipotecar a casa e fazer dois trabalhos”, recorda. “É a história de um homem que chega a casa, está a jantar com a mulher e um polícia aparece, acusa-a de matar o seu pai, ataca e volta tudo ao início”, descreve. “Tens 12 minutos em tempo real para tentar resolver isto.”
O conceito tem atraído interessados porque se destaca do videojogo típico. “É um thriller interativo, não é um jogo”, sugere Luís António. “Um jogo é algo em que tens pontuação, ganhas ou perdes, existe um conjunto de regras e estás a jogar para te divertires.” Mas aqui, argumenta, existe uma mensagem. Não é apenas uma vertente monetária ou de entretenimento puro. Se fosse um filme, seria inspirado em The Shinning, não em Velocidade Furiosa.
Luís António acredita que será possível cativar o interesse de pessoas que não são jogadores habituais - porque esses, como foi visível durante a E3, já compraram a ideia. É por isso que o ponto de vista é de cima para baixo, de onde se vê todas as divisões do apartamento onde acontece a ação. “O top down é muito fácil de navegar. Qualquer um pode jogar.”
O que pode ser desconcertante para muitos é que o jogo não dá instruções. “Metemos-te nesta situação e és tu, como jogador, que tens de tentar descobrir o que fazer. É muito aberto”, explica.
As demos mostram que há um número elevado de possíveis combinações e a forma como cada pessoa desenvolve o jogo está relacionada com a sua experiência, tornando o gameplay personalizado. Luís António calcula que alguém que é bom em jogos de aventura e puzzles demorará seis a oito horas a chegar ao que poderá considerar uma “conclusão satisfatória”.
Colocar Portugal no mapa
O mercado português de videojogos já teve vários altos e baixos nas últimas duas décadas, mas algo que continua a faltar é capacidade de financiamento e visibilidade internacional. “Conheço muitos games devs e eles dizem que investimento em Portugal é dificílimo. Ninguém acredita”, conta Luís António. E isto apesar de bons exemplos recentes, como Strikers Edge (Fun Punch Games), PuzzIAR (Bica Studios) ou Syndrome (Camel 101), entre outros jogos portugueses lançados nos últimos anos.
“Um dos meus objetivos é expandir a indústria portuguesa dos jogos”, diz, reconhecendo que o segmento “está a começar a crescer”. O seu sonho é voltar a Portugal e abrir um estúdio, se 12 Minutes tiver sucesso. Ainda assim, partilha uma lição: “Uma coisa que aprendi foi a não promover os estúdios, promover pessoas. Porque os estúdios abrem e fecham.”
Mais do que vestir a camisola, diz que quer contribuir para fazer “algo que mostre que os portugueses também têm talento”, construindo uma equipa e capitalizando no know-how que adquiriu em 15 anos de mercado internacional.
Para já, está a terminar a animação e o áudio do jogo, a gravar vozes com os atores e a fazer pós-produção. No próximo ano, pretende fazer o circuito dos eventos de videojogos internacionais e passar por Portugal. Sublinha a importância da projeção conseguida com a Xbox e a ajuda da Annapurna Interactive, ambas essenciais para pôr 12 Minutes no radar. “A Microsoft acredita no projeto e está a apoiá-lo”, sublinha. Mais tarde, acredita, “a visibilidade deste jogo pode ajudar a comunidade indie portuguesa”.