Quer (mais) uma prova que o Estado está capturado por interesses? Desde o início da gerigonça até ao início da pandemia, o Estado não produziu muito mais do que se produzia até então. A despesa das administrações públicas de facto aumentou, mas aumento foi por efeito de preço. Estamos praticamente a consumir os mesmos serviços públicos, mas a pagar mais pelos mesmos.
Das últimas contas trimestrais do INE, e analisando apenas os dados de 2016 a 2020 - os números deste executivo e antes da pandemia - é possível tirar várias conclusões.
Em primeiro lugar, os preços e as margens dos fornecedores públicos cresceram acima dos preços e das margens daqueles que vendem no setor privado. Os preços dos privados cresceram em média 2% ao ano. Os preços de quem abastece o Estado cresceram, em média, 2,5%. Os fornecedores públicos ganharam assim mais 0,5% ao ano, ou seja, 2% em termos acumulados sem fazerem nada de mais. Numa década irão receber mais 6% do que os restantes agentes económicos pela mesma unidade produzida.
Podemos achar que quem fornece o Estado está a ser mal pago e que é precisa de receber um pouco mais. Porém, essa necessidade é transversal a toda a economia - somos todos mal pagos -, fica assim a pergunta: por que motivo os fornecedores públicos devem aumentar as suas margens a um ritmo superior à restante economia? O Governo está a agravar as dificuldades da economia ao criar uma economia pública e uma economia privada. Este executivo está a favorecer quem o abastece.
Pior, o executivo está a dar o incentivo para que empresas e trabalhadores se virarem para dentro, e não para o exterior, para a criação de valor.
Mas há ainda pior. É que a quantidade da produção pública propriamente dita, entre 2016 e 2019, cresceu 2% em termos acumulados. Para se ter uma referência, o PIB (tudo o que produzimos na economia) cresceu 9%, neste mesmo período. Os serviços públicos produziram praticamente o mesmo.
Há uma ironia nestes números: Para quem defende que o Estado é que nos pode salvar e que havia uma grosseira austeridade que limitava a produção de serviços públicos, podemos dizer que estamos na mesma. O Estado não está a fazer mais, está é a pagar melhor. No fim, está a transferir recursos do setor mercantil - das empresas que trabalham no mercado aberto - para os fornecedores do Estado.
No fim ficam duas questões: Como pagar este o aumento dos gastos públicos? E como se tolera esta incapacidade de gerir a coisa pública?
Filipe Charters de Azevedo é fundador e CEO da DATA XL e da SafeCrop