Desigualdades à PS 

Ao que parece os anos de confinamento não afetaram o ensino: foram inócuos para a aprendizagem dos nossos filhos. Casa ou escola, ensino à distância ou presencial, professores ou pais, tudo isto foi indiferente para a evolução, para a aprendizagem e para o desenvolvimento das nossas crianças. O que lá vai, lá vai e o melhor mesmo é pôr uma pedra sobre o assunto. Ninguém gosta de recordar aqueles tempos sem escola, com as crianças a saltar em cima dos sofás, a sufocar dentro de casa, sem espaço, sem tarefas, sem ânimo, sem amigos, sem estímulos, A definhar com a ajuda dos ecrãs para os pais poderem trabalhar escondidos nos quartos.

Mas a verdade é que ninguém deixou de crescer por uns mesitos fechados em casa. E cá para nós, que ninguém nos ouve, acabaram todos por aprender a ler, foi ou não foi? É como a matemática: aquilo das contas de dividir com dois algarismos e dos números por classes serve para quê? Nós, que somos adultos, sabemos bem que não sabemos patavina do assunto e nunca nos perguntaram tal coisa em entrevistas de emprego. E os planetas? Quem quiser saber vai à net. Ou os graus dos adjetivos, para quê meu Deus: superlativo absoluto sintético e superlativo absoluto analítico, não são ambos maravilhosos?

Enfim, diria que foram dois anos de aprendizagem a conta-gotas, na esmagadora maioria dos casos a fingir, que afinal não tiveram consequências graves. Em idades críticas, em casos críticos e difíceis - como os de necessidades educativas especiais - também parece ter sido irrelevante.

Conclui-se, portanto, que podemos reduzir o ano letivo, cortar o horário escolar, podemos agilizar o programa, flexibilizar as metas e os objetivos curriculares, aliviar a carga de trabalho e a pressão sobre os alunos, os professores e os pais. Descontrair. Afinal, em seis meses consegue-se fazer o que antes dos confinamentos demorava dois anos a ensinar e a aprender.

Ou não?

Claro que não! E claro que tudo isto é uma das maiores vergonhas e escândalos nacionais. Dois anos de confinamentos fizeram com que milhares de crianças e jovens ficassem para trás e muitas com o seu futuro escolar comprometido.

Sem bases de leitura ou de matemática e sem que tenham assimilado conceitos básicos, o que os espera nos ciclos seguintes é o caminho das pedras. E os mais fracos serão as maiores vítimas: aqueles com necessidades ou dificuldades educativas e os que sejam menos autónomos ou necessitem de apoios suplementares para apanhar o comboio - que não espera por eles. Aqueles que precisam da escola como elevador social estão na borda do navio.

As desigualdades sociais na educação iniciaram-se no primeiro dia do primeiro confinamento e passado dois anos letivos não há uma medida, uma avaliação sobre os estragos dos confinamentos, um programa em curso para recuperação das aprendizagens ou um socialista que esteja disposto a combater as desigualdades que tanto dizem que combatem e a proteger as nossas crianças.

Lembram-se dos computadores? Ainda não chegaram às escolas. E as medidas de apoio à leitura? Nada.

É este o PS descrito por Orwell, o do Triunfo dos Porcos.

Jurista

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