Por um SNS europeu e universal

O SNS precisa de ser salvo. Os utentes não têm médicos de família, há consultas e cirurgia realizadas fora do tempo clínico recomendado. Os serviços de urgência estão fechados e as listas de espera aumentam. Portugal é dos países onde as famílias mais gastam em pagamentos diretos em saúde. Os profissionais são mal pagos - muito abaixo dos valores de mercado.

Para complicar, a despesa cresce em ritmo acelerado, mas o dinheiro falta e, simultaneamente, o sistema está a ser gerido com cativações e contabilidade criativa.

Mais: neste momento mais de 20% dos portugueses deixou de contar com o SNS, optando por seguros privados. E pior do que esta capitulação, esta redução da procura sobre os prestadores públicos não aliviou o sistema: quanto mais os portugueses procuram uma solução privada, mais o serviço público se agrava.

Não se trata apenas de processos e sistemas mal geridos. O resultado sobre a saúde dos portugueses já se faz sentir: a mortalidade materna nos últimos 5 anos (incluindo anos antes da pandemia) tem estado a bater recordes.

Também no campo ético-pessoal o SNS podia progredir. Diz o código deontológico dos médicos que em situação crítica estes devem tomar a decisão que o utente tomaria se tivesse a mesma informação e formação. Em termos práticos isto significa que o médico toma decisões deontologicamente enquadradas pelos utentes. É de elementar bom senso que a escolha sobre quem toma as nossas decisões seja nossa. O popular slogan de há uns anos "o meu corpo, as minhas regras" devia ser alargado para "o meu corpo, o meu médico".

Não faz qualquer sentido que a escolha do clínico seja feita por critérios baseados na geografia ou de uma qualquer estranha burocracia. A liberdade de escolha do prestador clínico tem de existir.

Em suma: o SNS está mal desenhado. Por uma questão de liberdade, equidade e sustentabilidade do sistema precisamos de mudar o serviço nacional de saúde, para um verdadeiro serviço universal de saúde. Um modelo de saúde como têm os outros países europeus.

Hoje, dia 15 de setembro, no dia do SNS, será apresentada uma lei de bases liberal para a saúde. Trata-se de uma solução europeia e que serviu de base ao programa da Iniciativa Liberal para as últimas eleições. Esta lei de bases assenta num sistema universal, sem exclusões de qualquer tipo e com acesso garantido por parte de todos os residentes.

A organização do sistema será por subsistemas públicos, à semelhança do sistema holandês. De um ponto de vista prático: os cidadãos pagarão as contribuições em linha com o seu rendimento, para um subsistema à sua escolha e cada um destes contratualizará com vários prestadores clínicos, sejam públicos, privados ou sociais. Os subsistemas terão autonomia financeira / receitas próprias à semelhança da Segurança Social, constituindo-se, em termos de contabilidade pública, com um subsistema do Estado, longe do braço do Ministério das Finanças.

Os autores acreditam, e há evidências nesse sentido, que com vários elementos de concorrência na organização do serviço de saúde este irá concorrer para a satisfação dos utentes, para um planeamento de recursos mais cuidado e para a adequada remuneração dos profissionais. O seu custo adicional será de apenas de mais 1% do PIB, um valor perfeitamente comportável.

Esta proposta do SNS já foi reconhecida e por vezes consensual - recorde-se, por exemplo, o trabalho do Prof. Dr. Serrão (nos anos 90), que chegou à mesma conclusão, ou o debate subjacente à criação do SNS. O Health Cluster, que tem Vítor Escária, chefe de gabinete do atual primeiro-ministro, como coordenador e um dos elementos de contacto, defendeu, em 2021, o sistema holandês como "o" modelo de financiamento e gestão da saúde (embora de difícil implementação).

À esquerda e à direita há espaço para mudar o estado das coisas.

A grande diferença face as anteriores abordagens é a redação efetiva de uma Lei de Bases e do mecanismo de transição pacífico do modelo centralista atual para um modelo concorrencial semelhante à grande maioria dos países europeus.

Não estamos condenados apenas a protestar. Podemos salvar o SNS.

* Texto baseado no livro: "Um nova lei de bases para a saúde: uma proposta liberal", que será apresentado hoje, no Grémio Literário, em Lisboa, às 18h. No lançamento haverá um debate alargado sobre o estado do SNS, esta e outras soluções. O debate contará com Álvaro Beleza, Alexandre Lourenço, Cármen Garcia, João Massano e Nadim Habib, moderados pelo Paulo Ferreira.

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